Gula: O clube dos Anjos - Luis Fernando Veríssimo
Era a hora do Ramos. O momento em que ele invariavelmente levanta-se para falar, segurando o copo de conhaque numa mão e o charuto na mão que usava para os seus gestos teatrais. Depois de sua morte, ninguém tomara o lugar de orador naquele instante de plenitude, que nunca mais tinha sido o mesmo. Certa vez, dez anos antes, o Ramos se erguera e ficara um longo tempo nos olhando, com afeto, antes de falar. Nos olhara um por um, como se nos abençoasse. Depois dissera: "Guardem este momento. Um dia nos lembraremos dele e diremos: foi o nosso melhor momento. Compararemos outros momentos de nossas vidas com ele e diremos que nunca mais fomos assim, exatemente assim. Nos saciaremos de novo, por certo, pois essa é a benção do apetite. Não é todo dia que se quer ver um pastoso Van Gogh ou ouvir uma crocante fuga de Bach, ou amar uma suculenta mulher, mas todos os dias se quer comer, a fome é o desejo reincidente, pois a visão acaba, a audição acaba, o sexo acaba, o poder acaba mas a fome continua, e se um fastio de Ravel é para sempre, um fastio de pastel não dura um dia. Em vez de "Ravel" e "pastel" ele talvez tenha dito "Pachebel" e "bechamel", estou citando de memória. Ramos: "Mas mesmo saciados, nunca mais estaremos saciados como agora, cheios das nossas próprias virtudes e do nosso prazer na amizade, na comida e na vida - e no conhaque." E ele erguera seu copo, fazendo com que todos erguessem o seu. "Senhores, exultai. Estamos no nosso ápice." Todos beberam. Depois ele dissera: "Senhores, chorai. Começou o nosso declínio." E todos beberam, mais alegres ainda. Naquela noite só saímos da mesa às cinco da manhã. (Página 41-2)
------------------------------------------------------------------------------------------------ Enquanto estava lendo "Gula", comecei a ter uma vontade louca de emagrecer! Por que esse medo todo de ser gordo? Tenho que rever meus (pre)conceitos... ------------------------------- Marina, obrigado pelo livro!
1 Comments:
gula é o segundo melhor.
luxuria é imbativel.
preguiça nem devia ter sido escrito.
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